A abordagem da Matemática na Educação Pré-escolar
Trabalhar a Matemática com as crianças pequenas num contexto institucional, com por exemplo os Jardins de Infância, exige o conhecimento dos fundamentos educativos e dos objectivos pedagógicos presentes nas Orientações Curriculares, que, assim como qualquer outra disposição curricular, está dependente de diversos factores.
Por outro lado, o ensino e o currículo educativo estão dependentes dos contextos educativos, exigindo dos educadores e dos professores a pesquisa de todas as fontes disponíveis e ainda a transformação do que é mais relevante e interessante para a comunidade em que se inserem. Apesar disso, existe um conjunto de aspectos a ter em consideração no ensino e na aprendizagem da Matemática, em qualquer nível escolar ou pré-escolar e que são comuns a muitos sistemas educativos. É o caso da importância atribuída à compreensão daquilo que as crianças e jovens aprendem, o que torna necessária a criação de ambientes educativos que promovam o desenvolvimento de diferentes processos e experiências matemáticas.
Objectivos gerais pedagógicos
De acordo com o que é referido nas Orientações Curriculares, é necessário, para haver um ambiente de aprendizagem satisfatório, seja em que domínio for, que se respeitem fundamentos como por exemplo o desenvolvimento e aprendizagem como vertentes indissociáveis, o reconhecimento da criança como sujeito do processo educativo, a construção articulada do saber e a exigência de resposta a todas as crianças.
Estes fundamentos são claros no que diz respeito à criança como sujeito activo na construção da sua compreensão matemática. Deste modo, “as crianças devem ter oportunidade de explorar tarefas onde possam inventar, conjecturar e resolver problemas, comunicando aos outros as suas estratégias de resolução” pois “as novas informações são incorporadas nos seus modelos, levando-as a reformular conceitos e a modificar as suas próprias idéias matemáticas” (Moreira & Oliveira,2004, p.27).
Processos Matemáticos
Um dos objectivos principais da educação matemática é levar a que todos os alunos aprendam a forma como as pessoas descobrem factos e métodos, sendo bastante importante que uma parte do tempo de aprendizagem seja dedicada a este aspecto.
(...) Trabalhar matemática com as crianças pequenas é precisamente desenvolver hábitos de pensamento e, apesar destas ainda não serem capazes de deduzirem de forma a que seja entendido matematicamente, estão já aptas a produzir conjecturas e a defendê-las segundo o seu ponto de vista.
(...) a actividade matemática envolve diversos processos. Uma parte destes, como por exemplo o cálculo, as operações e as medições merecem ter destaque no ensino, desde os níveis elementares. No entanto, outros processos, como a ordenação e a classificação, devem ser trabalhados desde o pré-escolar, em conjunto com a exploração de idéias que incluam o numero e relações quantitativas tais como o espaço, a forma e os padrões.
Classificação e ordenação:
Estes dois processos que reúnem grande importância em níveis pré-escolares, pois têm um papel fundamental na emergência de competências numéricas e geométricas e também no desenvolvimento de capacidades de observação e organização quando são propostas actividades para encontrar e formar padrões. Os conceitos de classificação e comparação que as crianças possuem podem ser, de forma natural, relacionados com padrões e relações.
(...)No que diz respeito à classificação, para que saiba classificar, é necessário que a criança seja capaz de incluir um objecto num determinado conjunto, tendo em conta determinadas propriedades. Para que isso aconteça, a criança tem de conseguir identificar propriedades nos objectos que a rodeiam. É essencial que tome consciência de que, por vezes, é possível classificar de diferentes formas, de acordo com as propriedades.
A classificação é fundamental para a formação de conjuntos, ou seja, no agrupamento de objectos de acordo com um critério como por exemplo a cor, a forma, a utilidade, reconhecendo assim semelhanças e diferenças de modo a estabelecer relações de pertença entre diferentes objectos e as propriedades identificadas.
As crianças reconhecem e discriminam de forma espontânea pequenos números de objectos. Com efeito, classificar o ambiente que a rodeia é algo que aprende a fazer desde que nasce, pois todos os sistemas culturais, de várias maneiras, segmentam o mundo em categorias de objectos e de pessoas.
Na verdade, classificam o mundo tendo em conta o modo como o interpretam e estas classificações, partilhadas entre os seus membros, são transmitidas às crianças. No fundo, classificar faz parte da socialização da criança e da sua aprendizagem cultural.
Quanto à ordenação de objectos, esta corresponde a dispô-los tendo em conta uma qualidade para a qual é possível considerar uma efectividade maior ou menor (com uma ordem ascendente ou descendente). A comparação de dois objectos é a forma mais simples de ordenar. No entanto, comparar mais do que três objectos simultaneamente torna-se complexo, exigindo um certo faseamento até que a criança seja capaz de o fazer através de um procedimento sistemático.
Ainda na ordenação, é importante que as crianças reconheçam as propriedades em que se baseiam para proceder a uma classificação ordenada de gradações relacionadas com diferentes qualidades de objectos, como por exemplo a altura.
Ordenar uma seqüência de acordo com um atributo, consiste em ser capaz de referir os elementos da seqüência, de modo a que se reconheça um precedente e um sucessor. O comprimento, o peso, a capacidade são exemplos de atributos.
Novas tecnologias, Matemática e Educação Pré-escolar
A controvérsia que inicialmente se gerou acerca das vantagens e desvantagens do uso do computador por crianças pequenas tem vindo a atenuar-se. Na verdade, a tecnologia tem nos dias de hoje um papel de extrema importância nas nossas vidas, estando também cada vez mais presente na vida das crianças, tanto em casa como nos contextos educativos como por exemplo a escola e o jardim de infância, podendo tornar-se um instrumento educativo de relevo.
Conforme as Orientações Curriculares referem “A utilização dos meios informáticos, a partir da educação pré-escolar, pode ser desencadeadora de variadas situações de aprendizagem, permitindo a sensibilização a um outro código, o código informático, cada vez mais necessário. Este pode ser utilizado em expressão plástica e expressão musical, na abordagem ao código escrito e na matemática.” (Silva & Pré-escolar citado em Moreira & Oliveira, 2004,p.156).
Várias investigações têm demonstrado que as crianças, especialmente as de idade pré-escolar podem utilizar de forma adequada os computadores, não correndo o risco de se isolarem, ao contrário do que se temia, parecendo até que este instrumento de ensino pode ajudar a criar situações de interacção entre elas, promovendo comportamentos de inter-ajuda e de tutoria entre pares.
Quanto à área curricular que mais potencia a utilização de computadores, de acordo com o que assinala Martí (1992) citado em Moreira & Oliveira (2004), essa área é a das matemáticas. Na verdade, a matemática e a linguagem informática apresentam-se como sistemas simbólicos, nos quais se encontram pontos de convergência. Ambas as áreas usam conceitos com um grau de abstracção elevado, com uma simbologia própria, distante da linguagem natural, assentando em regras de dedução e cálculo.
Segundo o mesmo autor, o que o computador traz de inovador à aprendizagem da matemática é o seguinte:
- Propricia a resolução de problemas, aliada à interactividade e à motivação intrínseca: a resolução de problemas é uma das competências mais importantes da matemática, que deve ser desenvolvida desde o jardim de infância.
- Favorece a comunicação entre alunos e entre alunos e professores: os computadores, devido à sua configuração, tornam mais fácil o trabalho de grupo, na medida em que o ecrã possibilita por um lado a visibilidade conjunta do avanço de determinada tarefa e o teclado e o rato possibilitam, por sua vez, uma manipulação partilhada. Estas possibilidades estimulam a comunicação e a troca de ideias sobre o que vai sendo realizado, o que pode ao mesmo tempo facilitar a aprendizagem matemática, uma vez que evita a criação de bloqueios e erros sistemáticos, que são mais frequentes num trabalho individualizado.
- Conduz à manipulação de símbolos: o uso do computador pressupõe uma utilização de um sistema de notação simbólica. (…) estas características ligadas ao uso do computador estão relacionadas com as particularidades da notação matemática.
- Estabelece a correspondência entre diferentes sistemas simbólicos: a exigência e rigor que são característicos da notação matemática e que se fundem com o rigor exigido pela utilização dos computadores é seguida de perto, no que diz respeito à matemática, pela necessidade de apreender a correspondência existente entre códigos matemáticos e códigos não matemáticos.
- Articula os aspectos declarativos e procedimentais do conhecimento: todo o tipo de conhecimento, especialmente o conhecimento matemático, é caracterizado pela interacção entre os aspectos declarativos ou conceptuais do conhecimento (relativos a significados relacionados e organizados, como por exemplo saber que um quadrado é uma figura fechada, com 4 lados iguais e ângulos de 90 graus) e os conhecimentos procedimentais, relativos a regras de acção que levam a um determinado resultado (por exemplo desenhar um quadrado). O meio informático favorece a articulação entre ambos, quer por assumir uma parte do trabalho realizado quer por apresentar situações que traduzem procedimentalmente os conhecimentos do aluno de tipo declarativo.
in: Moreira, D. & Oliveira, I., O jogo e a Matemática, 2004, Universidade Aberta, Lisboa